24/04/2025

Crítica | O Contador 2

O Contador 2 traz Ben Affleck no papel de Christian Wolff, um contador autista com habilidades excepcionais em matemática e combate, agora em uma missão aparentemente mais simples, resolver o mistério do assassinato de seu antigo mentor, Raymond King (J.K. Simmons), enquanto lida com uma teia de tráfico de pessoas, crimes financeiros e, é claro, muitos tiros. A narrativa se desenrola de forma um tanto labiríntica e, por vezes, inverossímil, como se os roteiristas estivessem mais interessados em empilhar elementos da trama do que em desenvolver algo realmente coeso. São gangues de tráfico de pessoas, imigrantes indocumentados, e até um enigma matemático, tudo embalado em uma caótica sequência de pouca ação.

Apesar disso, o filme encontra seu ponto alto nas interações entre Wolff e seu irmão, Braxton (Jon Bernthal), que se juntam na missão com uma química improvável. Bernthal se destaca, proporcionando momentos de verdadeiro carisma e vulnerabilidade em um personagem que, à primeira vista, parece apenas uma versão mais irreverente do assassino frio. A tensão entre os dois irmãos, um emocionalmente distante e outro desesperadamente tentando se reconectar, dá ao filme uma camada emocional que o diferencia das demais produções de ação da atualidade.

A interpretação de Ben Affleck como Christian Wolff é interessante e bem diferente, um personagem taciturno e socialmente desajeitado, mas com espaço para mostrar seu humor peculiar e sua dificuldade em lidar com as nuances da interação humana. A transformação de Wolff de um herói solitário para um homem que tenta, timidamente, se reconectar com o mundo, é feita com a sutileza característica de Affleck, e é nesse aspecto que o filme ainda brilha.

No entanto, O Contador 2 falha ao diluir sua complexidade emocional, substituindo-a por uma sucessão de tiroteios e cenas que não agregam muito à experiência. As tentativas de "diversão" com o personagem de Affleck como as cenas de encontros ou suas dificuldades com a dança são, no melhor dos casos, pequenas distrações que tentam humanizar Wolff, mas são rapidamente abafadas pela voracidade da trama.

Um ponto de destaque é a presença de Justine (Allison Robertson), assistente de Wolff, que traz um pouco de inclusão com sua representação como uma mulher autista não verbal, cuja inteligência e habilidade técnica se tornam vitais para o desenvolvimento da história. A ideia de criar uma "liga de super-heróis neurodivergentes", com jovens gênios da tecnologia, pode ser vista como uma celebração da diferença, mas peca ao não explorar mais profundamente esses personagens e suas habilidades, uma oportunidade desperdiçada que poderia ter acrescentado mais profundidade ao filme.

O Contador 2 se limita a entregar um entretenimento mais simples e, por vezes, morno, mas o tipo de morno que, ainda assim, agrada. A ação apesar de pouca é eficaz, as performances são satisfatórias, e o humor, embora irregular, consegue arrancar risadas. Porém, o filme nunca atinge a profundidade, mesmo que de forma imperfeita.

22/04/2025

Crítica | LOONEY TUNES - O FILME: O DIA QUE A TERRA EXPLODIU

O Dia que a Terra Explodiu é uma explosão de caos animado, piadas bobas e referências modernas embaladas no espírito clássico dos Looney Tunes. A nova aventura estrelada por Gaguinho e Patolino acerta ao preservar a essência da série original, mas atualiza seu visual e humor para dialogar com a geração atual, ainda que tropece em seu ritmo narrativo e excesso de subtramas.

O estilo de animação mantém o charme “cartoonesco” que marcou gerações, mas com um toque de modernidade que não agride os fãs mais nostálgicos. Visualmente, o filme é vibrante e movimentado — o suficiente para prender a atenção dos pequenos e arrancar um ou outro sorriso dos adultos. A trilha sonora cumpre sua função sem grandes destaques, mas a dublagem brasileira brilha: as localizações e piadas adaptadas garantem boa parte das risadas.

A trama gira em torno de uma invasão alienígena e uma fábrica de chicletes que esconde um plano de controle mental — sim, é tão absurdo quanto parece, e essa é justamente a proposta. A história se desdobra em sequências hilárias e surreais, como a sátira do mercado de trabalho moderno, onde Patolino e Gaguinho tentam ser influenciadores digitais para reformar a casa. É uma crítica leve e bem-humorada à efemeridade dos modismos e à busca desesperada por relevância online.

Outro destaque positivo está na relação entre Gaguinho e Petúnia Pig. A dinâmica entre os dois, marcada por gagueiras nervosas e timidez adolescente, traz um charme inesperado e uma camada emocional leve, mas eficiente. Já Patolino continua sendo o motor do caos, levando a história por caminhos cada vez mais mirabolantes, inclusive descobrindo o plano alienígena ao se infiltrar na fábrica de chicletes.

Apesar de tantos acertos pontuais, o filme sofre com um problema de estrutura: muita coisa acontece em apenas 90 minutos. São reviravoltas, brigas, reconciliações, novos personagens e, claro, um alienígena que — plot twist! — só queria salvar a Terra ao envolvê-la em uma gigantesca bola de chiclete. É divertido, mas a sensação é de que o filme quer entregar demais e nem sempre com o tempo necessário para desenvolver bem cada arco.

A mensagem final sobre amizade, perdão e colaboração é clara e bem-vinda. Quando Gaguinho, Petúnia, Patolino, um alien e um inventor maluco se unem para salvar o planeta, o filme atinge seu clímax caótico e cativante. Não há aqui pretensão de profundidade, mas sim o desejo sincero de entreter — e nisso, ele é eficaz.

Looney Tunes - O Filme: O Dia que a Terra Explodiu é uma comédia frenética, cheia de cor, piadas rápidas e lições simples sobre amizade e trabalho em equipe. Embora apresse algumas resoluções e sofra com excesso de subtramas, ele cumpre seu papel como entretenimento familiar leve e divertido. As crianças devem se encantar com as trapalhadas, e os adultos, pelo menos, esboçar alguns sorrisos nostálgicos.

16/04/2025

CRÍTICA | PECADORES


Pecadores é uma obra ousada e multifacetada que reafirma o talento de Ryan Coogler como um dos cineastas mais relevantes da atualidade. Ambientado no sul dos Estados Unidos, em 1932, o filme mescla horror, drama, história e crítica social em um épico gótico sulista, onde o vampirismo serve como poderosa metáfora para as feridas abertas da “América negra”.

Coogler reconstroi Clarksdale, no Mississippi, como um microcosmo carregado de tensões raciais, espirituais e culturais. Nesse cenário, os irmãos Smoke e Stack, interpretados com maestria por Michael B. Jordan em um papel duplo, retornam da Primeira Guerra Mundial e do submundo de Chicago para abrir um bar de blues projeto que, mais do que um negócio, representa uma tentativa de liberdade e reconstrução identitária. Jordan entrega uma performance sutil e impactante, distinguindo os gêmeos não por gestos caricatos, mas por nuances emocionais e éticas que espelham dilemas morais mais profundos.

O filme se destaca ao utilizar o mito do vampiro para representar a opressão estrutural e o parasitismo da cultura branca sobre a negritude americana. Os antagonistas vampiros liderados pelo inquietante Remmick (Jack O’Connell) simbolizam não apenas o terror sobrenatural, mas também o desejo colonial de sugar a vitalidade cultural, emocional e até física dos negros. O fato de precisarem ser "convidados a entrar" é um viés sutil ao controle sobre os espaços de resistência e prazer negro como o bar de blues, centro da narrativa.

Visualmente, Pecadores é um espetáculo. A fotografia de Autumn Durald Arkapaw mergulha o espectador em uma atmosfera ao mesmo tempo lírica e sombria, emoldurada por visuais ricos que evocam tanto a decadência rural quanto a exuberância do blues. A trilha sonora, centrada em Preacher Boy (Miles Caton), canaliza o espírito de Robert Johnson e posiciona a música como força tanto libertadora quanto amaldiçoada, uma tensão que ecoa o dilema entre fé e profanação.

O blues é tão marcante que em muitos momentos, o filme quase se transforma em um musical, mas um musical feito à sua maneira: cru, intenso e cheio de significado. Cada canção tem peso narrativo, emocional e simbólico, ajudando a contar a história mais do que muitos diálogos fariam. Não é só trilha sonora, é parte da alma do filme. E, diferentemente de muitos musicais tradicionais, aqui a música não alivia a tensão ela a intensifica.


Coogler demonstra domínio absoluto sobre o ritmo e a tensão narrativa. A primeira hora do filme, quase desprovida de elementos de horror, constroi lentamente os vínculos com a comunidade e as motivações dos protagonistas, antes de mergulhar o público num pesadelo que é tanto simbólico quanto histórico. A virada para o horror sobrenatural é abrupta, mas eficaz, lembrando que, mesmo na ausência de monstros, o verdadeiro terror já estava presente: o racismo, a pobreza, a perda.

Mesmo quando extrapola em simbolismos e costura metáforas demais em seu tecido narrativo, Pecadores se destaca justamente por essa ambição desmedida. É um filme que não teme ser grande, complexo, cheio de camadas e isso o diferencia no mar de narrativas simplificadas do cinema atual. A longa sequência pós-créditos com Buddy Guy, embora possa soar como um epílogo teórico, é na verdade um manifesto: a arte negra continua, ecoa, sobrevive e transforma. Coogler não teme o excesso, porque entende que às vezes é preciso gritar para ser ouvido.

Pecadores é cinema no seu estado mais potente. Um filme que mistura arte e entretenimento sem pedir licença. Forte, intenso, emocionante. Coogler entrega uma obra que assusta, comove e faz pensar. Ao transformar o horror em reflexão histórica, ele prova que contar histórias sobre dor e resistência também pode ser um ato de cura. 

CRÍTICA | NAS TERRAS PERDIDAS

Dirigido por Paul W.S. Anderson e estrelado por Milla Jovovich e Dave Bautista, “Nas Terras Perdidas” é uma adaptação do conto homônimo de George R. R. Martin. Com um enredo que mistura fantasia, distopia e elementos de faroeste pós-apocalíptico, o filme se propõe a explorar grandes temas como desejo, poder, solidão e traição, mas falha em quase todas as frentes. O resultado é uma obra que desperdiça seu potencial narrativo, confusa e termina como uma colagem desbotada de ideias ambiciosas, mas mal executadas.

A história gira em torno da feiticeira Gray Alys (Milla Jovovich), uma personagem que nunca recusa um pedido desde que seja pago. Quando a princesa Melange deseja obter o poder de se transformar em outras formas, Alys aceita a missão de buscar um metamorfo nas chamadas “terras perdidas”. No entanto, o amante da princesa, Jerais, a procura secretamente para pedir que ela impeça a princesa de conseguir esse poder. Alys, em um gesto contraditório que deveria ser o ponto de tensão central do enredo, aceita ambas as solicitações, sem que o roteiro consiga extrair qualquer dilema dramático relevante dessa contradição.

Ao lado de Boyce (Dave Bautista), um caçador contratado para guiá-la pelas terras inóspitas, Alys embarca em uma jornada que envolve monstros, religiosos fanáticos, feitiçaria e traições. Mas o que poderia ser um épico emocional de conflitos morais e ação se torna uma sucessão entediante de cenas desconectadas e sem impacto.

A estética do filme aposta em um visual digital saturado por efeitos especiais que remetem a cenas de videogames da era PS3 e não de forma elogiosa. A fotografia, marcada por exagerados efeitos de luz e reflexos que obscurecem mais do que revelam, torna o cenário artificial e insípido. As tentativas de criar uma atmosfera imersiva falham pela ausência de coerência visual e pela repetição de tons sépia e filtros que embaçam a tela mais do que contribuem para a construção de mundo.

As sequências de ação, embora pontualmente bem coreografadas, são frequentemente sabotadas pela montagem apressada e pelos efeitos visuais genéricos. Em certos momentos, o filme até acerta, a câmera flutuando por dentro de um ônibus pendurado à beira de um abismo, por exemplo, mostra lampejos do estilo dinâmico que consagrou Anderson em obras como “Resident Evil (2002)” e -“Mortal Kombat (1995)”. Mas são exceções em um mar de mediocridade visual.

Dave Bautista é o destaque do elenco. Sua atuação, embora limitada pelo roteiro, oferece alguma emoção genuína. Boyce é um caçador endurecido pela vida, mas com camadas emocionais que Bautista consegue comunicar com dignidade, da tristeza ao ver seu animal de estimação morto, à entrega de falas que, mesmo sendo clichês, ganham certo carisma graças à sua entrega.

Já Milla Jovovich parece perdida. Conhecida por sua forte presença em personagens de ação, aqui sua Gray Alys carece de profundidade emocional. O mistério que deveria envolver a personagem vira apatia, e seu semblante inexpressivo contribui para a monotonia das cenas. A tentativa de conferir uma aura enigmática à personagem acaba resultando em uma performance quase automática, como alguém entediada com o próprio papel.

Arly Jover, como a fanática caçadora de bruxas Ash, entrega uma performance mais intensa, destoando positivamente do resto do elenco, ainda que sua personagem seja mal desenvolvida e caricata. É uma pena que a construção de seus antagonismos seja tão rasa quanto sua motivação.

Narrativamente, o filme tropeça em suas ambições. Os diálogos são pesados e artificiais, com frases que caem como sacos de areia sobre a narrativa. A história, que deveria evocar uma jornada de descobertas e conflitos internos, torna-se uma série de cenas expositivas sem emoção ou desenvolvimento significativo. Os temas centrais, o desejo humano, os limites do poder, a futilidade da busca por controle são apresentados de forma superficial, quase como um lembrete de que “isso deveria ser profundo”.

A tentativa de construir um universo próprio falha por excesso de jargões inventados e uma mitologia pouco clara. Os elementos que deveriam servir como motor do mundo como a ordem religiosa fanática, a política da corte, ou as criaturas mágicas são usados como pano de fundo sem função narrativa convincente. Isso contribui para a sensação de que há muito acontecendo, mas nada que realmente importe.

Nas Terras Perdidas é, antes de tudo, um filme frustrante. Frustrante porque carrega em sua origem uma obra de George R. R. Martin, um autor conhecido por sua capacidade de explorar personagens complexos em mundos igualmente ricos. Frustrante porque conta com atores capazes de entregar performances significativas. E frustrante porque Paul W. S. Anderson já demonstrou anteriormente talento para lidar com cenários de ficção e fantasia com energia e estilo.

Entretanto, aqui, Anderson parece distante de suas qualidades autorais. Sua direção é genérica, sem alma, presa a convenções visuais já ultrapassadas e a um roteiro que não sabe o que fazer com o próprio material. O filme desperdiça a chance de explorar a densidade emocional de sua premissa e se afoga em efeitos visuais rasos e cenas de ação sem impacto.

O longa é um exemplo de como a forma pode sufocar o conteúdo especialmente quando a forma está tão desgastada. O filme não é apenas esquecível, é um lembrete de que nenhuma quantidade de CGI ou ambientação fantástica pode substituir o coração de uma boa narrativa: personagens bem desenvolvidos, conflitos significativos e direção.

14/04/2025

Crítica | A Mais Preciosa das Cargas

"A Mais Preciosa das Cargas" é um soco no estômago disfarçado de conto de fadas. Em meio ao horror da Segunda Guerra Mundial, Michel Hazanavicius — vencedor do Oscar por O Artista — retorna com uma obra ousada, delicada e devastadora, que usa o formato da animação não como refúgio, mas como amplificador de emoções.

Logo nos primeiros minutos, o espectador é conduzido por uma narração que remete à estrutura das fábulas clássicas: uma floresta distante, um casal humilde, um bebê abandonado. A estética visual, marcada por uma animação artesanal belíssima, com traços delicadamente imperfeitos, remete aos livros ilustrados infantis — o que torna o contraste com a brutalidade da narrativa ainda mais potente.


A mulher do lenhador, que encontra e acolhe a criança jogada de um trem que transportava judeus rumo aos campos de extermínio, é o centro moral da história. Através de sua compaixão incondicional, o filme revela a capacidade do ser humano de resistir à barbárie com pequenos atos de ternura. Mas Hazanavicius não nos poupa: conforme a trama se desenvolve, as nuances do conflito emergem com força. O que começa como um conto ganha contornos sombrios, revelando que os mitos, como o da floresta perigosa ou do inimigo monstruoso, muitas vezes são reais, só que assumem formas humanas.

A trilha sonora de Alexandre Desplat é uma peça-chave na construção emocional do filme. Seus acordes suaves, melancólicos e por vezes solenes, acompanham a narrativa com precisão cirúrgica, sem jamais manipular o espectador, apenas intensificando a sensibilidade de cada cena.

Talvez o aspecto mais impressionante da obra seja sua coragem. Ao optar pela animação — um meio muitas vezes associado ao escapismo ou à leveza — Hazanavicius desafia convenções e prova que a forma não limita o conteúdo. Pelo contrário: a estética poética da animação confere à narrativa uma camada de simbolismo que potencializa o impacto dos horrores retratados. O resultado é um paradoxo tocante: quanto mais bela a forma, mais cruel e tocante se torna a realidade que ela revela.

A Mais Preciosa das Cargas é um filme comovente, que atravessa o espectador com sua "beleza triste". É uma fábula sobre a guerra, mas também sobre amor, sacrifício e humanidade. Um lembrete poderoso de que, mesmo nos períodos mais sombrios da história, atos de luz podem nascer e que esses atos, por menores que pareçam, têm o poder de transformar o mundo ao redor.

09/04/2025

CRÍTICA | DROP: AMEAÇA ANÔNIMA


Drop: Ameaça Anônima, de Christopher Landon, é um thriller intrigante e sucinto que entrega bem sua proposta, sendo um filme enxuto, com cenário contido, tensão crescente e uma protagonista no centro de uma espiral paranoica digital. Com duração enxuta de 90 minutos e quase inteiramente ambientado em um restaurante elegante, Drop: Ameaça Anônima transforma um encontro romântico casual em um pesadelo tecnológico e, curiosamente, também em uma jornada de reconexão emocional.

A trama acompanha Violet (Meghann Fahy), uma terapeuta especializada em sobreviventes de violência doméstica e mãe solo, que finalmente decide sair para um encontro após anos de trauma e luto. Mas o que começa como uma típica noite de nervosismo e expectativas vira um jogo de vida ou morte quando Violet começa a receber mensagens misteriosas via "DigiDrop" uma versão ficcional do AirDrop exigindo que ela envenene seu par, Henry (Brandon Sklenar), ou sua irmã e filho serão mortos por um invasor em sua casa. O terror vem, literalmente, na palma da mão.

Landon, combina o seu enredo absurdo com um afiado senso de ritmo. A tecnologia especialmente os smartphones é usada aqui não como mera ferramenta de ambientação, mas como catalisadora narrativa, gerando tensão real e bem contemporânea. A ideia de que o perigo pode estar a apenas 15 metros de distância, escondido entre outros frequentadores do restaurante, gera uma atmosfera sufocante e claustrofóbica, onde cada tela luminosa ao redor pode abrigar uma ameaça invisível.

A força do filme reside inteiramente na atuação de Meghann Fahy. Após seu grande destaque em The White Lotus, ela prova aqui ser uma atriz de primeira, entregando uma performance carregada de viés emocional e controle técnico. Violet precisa sorrir, seduzir, improvisar e sobreviver a tudo isso enquanto esconde o pânico que cresce dentro de si. A tensão não está apenas no que pode acontecer, mas no esforço que ela faz para parecer que nada está acontecendo.


Brandon Sklenar também acerta como o "homem ideal" Henry, cuja bondade genuína serve como contraponto ao caos digital. O roteiro brinca com as expectativas do espectador, nunca deixando claro se Henry é um salvador, uma vítima ou algo mais, e a química entre os dois é explícita, o que torna a ameaça mais impactante.

Drop: Ameaça Anônima também serve como uma crítica social para a experiência feminina no mundo moderno, sobretudo na exposição constante à violência, ao controle e à obrigação de manter a compostura. Ao transformar a tensão de um primeiro encontro em um thriller de sobrevivência, o filme toca em temas como trauma, vigilância e a performance forçada de normalidade.

Visualmente, Landon e o diretor de fotografia conseguem fazer do restaurante um espaço dinâmico, quase teatral, usando o ambiente e os espelhos para reforçar a paranoia crescente. A trilha de Bear McCreary e a edição de Ben Baudhuin contribuem para a fluidez da narrativa, que só tropeça ligeiramente quando tenta amarrar as pontas do mistério. A revelação do vilão e suas motivações pode soar fraca ou implausível, mas a jornada até ali é tão atraente que isso pouco importa.

CRÍTICA | OPERAÇÃO VINGANÇA



Com Operação Vingança, o diretor James Hawes se arrisca em um território que já se viu de tudo, o thriller de espionagem movido pela vingança pessoal traz uma premissa clássica, Charlie Heller (Rami Malek), um analista da CIA com mais intimidade com códigos e telas do que com armas, vê sua vida desmoronar quando sua esposa (Rachel Brosnahan) é assassinada durante um ataque terrorista em Londres. Insatisfeito com a inércia burocrática da Agência, Heller decide caçar os responsáveis com as próprias mãos mesmo que isso signifique virar as costas para tudo o que conhece.

Apesar de flertar com o estilo de “Jason Bourne”, Operação Vingança é mais inteligência do que físico, ainda que nem sempre de forma satisfatória. Rami Malek entrega uma performance contida (pra variar), marcada por olhares vidrados e reações sutis, ideal para representar o luto transformado em frieza calculada, mas que às vezes soa tão apática quanto o próprio roteiro.

O filme tenta subverter o molde tradicional dos filmes de vingança ao manter seu protagonista longe do estereótipo do herói musculoso e infalível. Charlie não é um assassino nato, não sabe atirar direito e precisa assistir a tutoriais no YouTube para aprender a arrombar fechaduras. Isso traz momentos de humor involuntário ou, quem sabe, autoconsciente que fazem falta em outras partes da narrativa. Há algo interessante em ver um “homem comum” tentando colocar em prática um belo plano de vingança, mas a execução, muitas vezes, parece mecânica e inverossímil, mesmo dentro dos parâmetros do gênero.


A direção de Hawes, marcada por um visual elegante e eficiente, com boas locações em Istambul, Paris e Londres, mantém a história em movimento. Porém, a estética fria e a paleta acinzentada acentuam a distância emocional que o filme já impõe por meio de seu roteiro funcional e seus personagens pouco desenvolvidos. Mesmo com um elenco recheado de nomes de peso como Laurence Fishburne, Caitriona Balfe, Michael Stuhlbarg, Jon Bernthal, poucos ganham espaço para brilhar. A maioria é relegada a tipos genéricos ou flashbacks sentimentais, como é o caso de Brosnahan, cuja personagem existe apenas para ser o gatilho da trama.

Há também uma camada de crítica política com vilões que ecoam o populismo contemporâneo, tramas de encobrimento militar e alegorias discretas à supremacia branca, mas tudo isso é apresentado de maneira tão superficial que não pesa na experiência do espectador. Operação Vingança parece não saber se quer ser uma sátira esperta ou um thriller sério de vingança moral.

Ainda assim, o filme tem seus méritos. Há tensão suficiente para manter o interesse, uma trilha sonora maneira de Volker Bertelmann que injeta energia onde o roteiro falha, e algumas sequências de ação criativas incluindo um clímax à beira do absurdo em um iate no Báltico. Além disso, a tentativa de transformar a inteligência em arma principal do herói é bem interessante, ainda que imperfeita, é um exemplo de renovação do gênero.