01/05/2025

CRÍTICA | THUNDERBOLTS*

Depois de uma sequência de fracassos criativos e comerciais que ameaçaram corroer os alicerces do império Marvel, Thunderbolts* surge como uma tentativa arriscada de reinventar a fórmula de super-heróis. Dirigido por Jake Schreier, o filme reúne uma trupe de personagens secundários, rejeitados e emocionalmente danificados, e os empacota como uma espécie de "Vingadores da terapia em grupo". O resultado é um thriller de espionagem disfuncional e estilizado, que mistura ação, drama e traumas não resolvidos e consegue, contra todas as probabilidades, entreter.

O que torna Thunderbolts* minimamente relevante e até ousado não é seu enredo, que flerta com a saturação típica do gênero, mas seu foco narrativo nas feridas emocionais dos personagens. Yelena Belova (Florence Pugh), irmã da Viúva Negra, lidera esse grupo de desajustados com uma combinação agridoce de cinismo e vulnerabilidade. Sua atuação é a espinha dorsal do filme, oferecendo profundidade emocional em um universo que, até aqui, costumava apenas acenar na direção da complexidade psicológica antes de explodir mais um prédio.

Yelena, assim como os demais Thunderbolts* o Red Guardian decadente (David Harbour), o ex-Capitão América homicida John Walker (Wyatt Russell), a etérea e mal definida Ghost (Hannah John-Kamen) e o atribulado Bob (Lewis Pullman) carrega no corpo e na mente os destroços de escolhas passadas. Eles não são heróis em busca de glória, mas sobreviventes tentando encontrar algum significado. 

O roteiro tenta explorar esse terreno com sensibilidade, ainda que, por vezes, tropece em sua própria ambição: os traumas são discutidos com frequência quase didática, e a estética de "terapia pop" corre o risco de parecer mais uma moda do que um mergulho honesto em saúde mental.

Ainda assim, Thunderbolts* acerta em alguns pontos. O filme tem estilo, o que já o coloca à frente de boa parte da fase mais recente do MCU e conta com momentos de direção visualmente inspirada, como a sequência inicial de Yelena prestes a saltar de um arranha-céu, que traduz com elegância a conexão entre o abismo físico e o emocional. A ação, conduzida com precisão e criatividade, respeita o tom do filme ao evitar a grandiloquência vazia e investir em coreografias quase íntimas, onde os golpes trocados parecem tanto externos quanto internos.

É claro que há excessos. O terceiro ato tropeça ao tentar evocar o espírito psicodélico de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, sem a mesma coesão ou genialidade. A batalha final nos tais “quartos interligados de vergonha” é uma metáfora visual interessante, mas mal resolvida é mais admirável em intenção do que em execução. E a personagem Ghost, que já fora pouco desenvolvida em sua origem, continua sendo um mistério sem recompensa.

No entanto, quando Florence Pugh está em cena o que é felizmente frequente, o filme ganha alma. Seu domínio de nuances, sua entrega física e emocional, e seu timing cômico afiado tornam Thunderbolts* não apenas assistível, mas memorável. Pugh transforma um blockbuster de franquia em um estudo de personagem que merecia reconhecimento além das fronteiras do gênero, apesar de ser a única contemplada.

Thunderbolts* não redefine o que um filme de super-herói pode ser, mas lembra que até os universos mais saturados podem encontrar frescor se decidirem olhar para dentro dos seus personagens e de sua própria história, porém isso não necessariamente entrega algo perfeito. Com falhas, sim, mas com coragem e sinceridade, o filme talvez seja o suspiro que a Marvel precisava. E, com sorte, o primeiro passo de uma nova fase menos preocupada com cronogramas intergalácticos e mais interessada no que significa, afinal, ser humano mesmo que se use uniforme de lycra.

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