CRÍTICA | NÃO SOLTE
Não Solte, dirigido por Alexandre Aja, é um thriller psicológico que explora a linha tênue entre o amor protetor e a paranoia, ambientado em um mundo pós-apocalíptico. O filme segue uma mãe (interpretada por Halle Berry) e seus dois filhos, Nolan e Samuel, que vivem em uma cabana isolada e são obrigados a seguir regras rígidas, como nunca sair sem estarem amarrados a uma corda que os conecta de volta ao lar. Esse sistema de segurança, que serve para mantê-los longe de um mal que a mãe acredita existir na floresta, se transforma em um estudo sobre os limites da proteção materna e as fronteiras entre realidade e delírio.
A performance de Halle Berry é um dos pontos altos do filme. Sua interpretação consegue transmitir o pavor da mãe, uma mulher assombrada por traumas do passado e visões assustadoras de seus familiares mortos. A atuação de Berry é intensa, especialmente em momentos em que luta para proteger os filhos enquanto tenta manter sua própria sanidade. Contudo, embora sua performance seja muito boa, a construção da personagem se perde devido ao roteiro inconsistente, que oferece pouco espaço para que o público compreenda plenamente as motivações ou complexidades de sua psique.
Aja, conhecido por sua habilidade em criar tensão em espaços confinados, emprega novamente suas técnicas para manter o suspense, utilizando bem a casa isolada e os cenários tenebrosos da floresta. A direção de Aja cria uma atmosfera claustrofóbica e visualmente sombria, com o diretor de fotografia Maxime Alexandre adicionando uma estética suja e gótica que aumenta a sensação de perigo iminente. A trilha sonora de Robin Coudert complementa esse tom sombrio, trazendo à narrativa um sentimento de ansiedade constante.
Por outro lado, "Não Solte" falha em organizar suas várias ideias temáticas. O roteiro de KC Coughlin e Ryan Grassby parece confuso, misturando conceitos como trauma, doença mental, superproteção e alegorias à pandemia, sem uma linha clara que conecte esses temas de forma eficaz. A corda, que poderia simbolizar a dependência e a segurança, torna-se uma metáfora não totalmente explorada, e o suposto mal da floresta nunca é devidamente explicado, deixando o público se perguntando se tudo não passa de uma ilusão da mãe. Essa ambiguidade pode funcionar em filmes de terror psicológico, mas aqui se traduz em uma confusão narrativa que compromete o impacto da história.
A trama também é marcada por referências a outras produções do gênero, como “Um lugar silencioso”, mas sem a originalidade e a coesão necessárias para se destacar. A tensão inicial é bem construída, com uma série de cenas que exploram o medo crescente dos filhos em relação à mãe. O filme sugere que a mãe pode estar projetando seus próprios medos e traumas neles, mas essa ideia é tratada de maneira superficial, resultando em um final que parece abrupto e deixa pontas soltas.
Apesar dos problemas narrativos, algumas cenas específicas, como uma sequência com o cachorro da família, conseguem criar um suspense genuíno. Esses momentos, embora eficazes, são diluídos em meio a outras cenas que se arrastam e não contribuem para o avanço da trama. O terceiro ato é especialmente problemático, pois deixa de lado as questões mais intrigantes da história e opta por um clímax confuso e sem sentido, esvaziando o que poderia ter sido um final potente.
Não Solte, tenta ser uma parábola sobre a proteção materna, mas sua execução apressada e sua falta de clareza temática prejudicam a experiência. Halle Berry oferece uma performance dedicada, e Aja demonstra habilidade técnica na construção de tensão, mas o roteiro não apoia essas qualidades com uma narrativa coerente e impactante. Para os fãs de Aja, o filme pode decepcionar pela ausência da intensidade e do foco que caracterizam suas obras mais bem sucedidas. "Não Solte" é uma experiência visualmente interessante, mas narrativamente dispersa, que provavelmente deixará o público pronto para “deixar ir” quando os créditos finais rolarem.
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