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Crítica | A Mulher no Jardim


O cinema de terror contemporâneo tem encontrado no trauma e na dor emocional um terreno fértil para novas narrativas, substituindo monstros clássicos por demônios internos mais sutis, mas igualmente devastadores. "A Mulher no Jardim", produção da Blumhouse dirigida por Jaume Collet-Serra, tenta caminhar por essa trilha sombria e metafórica, mas tropeça ao transformar o luto em alegoria sem a devida coesão narrativa.

O filme se destaca, inicialmente, por sua ambientação e pela força de uma imagem central poderosa: uma mulher vestida de preto, sentada em silêncio no quintal de uma casa em ruínas. Essa figura misteriosa interpretada com um viés inquietante por Okwui Okpokwasili, encarna uma presença que não precisa de palavras para ameaçar, e é justamente aí que reside o maior trunfo do longa: a sugestão. A imagem evoca a sensação de que algo está fundamentalmente errado, não só fora de casa, mas principalmente dentro dela, tanto no espaço físico quanto no psicológico.


Danielle Deadwyler entrega uma performance intensa e profundamente comovente como Ramona, uma mãe em frangalhos tentando manter a sanidade após a perda do marido. Ela interpreta sua personagem com uma vulnerabilidade controlada, oscilando entre negação, paranoia e colapso, sustentando praticamente sozinha o peso emocional do filme. Em um filme mais sólido, sua atuação seria o centro de um drama psicológico memorável. Aqui, ela é uma âncora jogada ao mar revolto de um roteiro que não sabe exatamente para onde navegar.

O texto de Sam Stefanak parece fascinado por metáforas, mas frustrantemente apressado em explicitá-las. A mulher no quintal claramente uma encarnação do luto, da culpa ou de algum trauma enterrado deixa de ser um mistério instigante à medida que o filme insiste em explicações e reviravoltas pouco inspiradas, que diluem a tensão criada com tanto esmero na primeira hora. A construção atmosférica, que remete à pintura de Andrew Wyeth e ao folclore sulista, é eficiente, mas não encontra eco em um enredo que parece mais interessado em colecionar referências (de Us a Black Mirror) do que em desenvolver uma identidade própria.

Collet-Serra, conhecido por seu trabalho com thrillers e subversões genéricas eficazes (A Órfã, Águas Rasas), parece preso entre dois estilos: o suspense simbólico à la Ari Aster e o horror mais direto e comercial que o consagrou. O resultado é um filme que sugere profundidade, mas que, ao final, revela-se raso em sua exploração temática.


Ainda assim, não é um fracasso completo. A direção de fotografia de Pawel Pogorzelski confere ao filme uma beleza melancólica que contrasta com o terror iminente. A trilha sonora minimalista acerta ao não querer guiar o espectador pelo medo, mas sim deixá-lo pairar em um estado constante de inquietação.

"A Mulher no Jardim" é uma obra que começa com promessas visuais fortes, mas acaba se perdendo em sua própria ambição simbólica. Ao tentar elevar o gênero por meio de metáforas psicológicas e subversões narrativas, esquece que, às vezes, o terror mais eficaz é o que não precisa ser decifrado, apenas sentido. Danielle Deadwyler brilha, mas infelizmente brilha sozinha.

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